sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

SAUDADE BREJEIRA - FINAL

SAUDADE BREJEIRA - FINAL

Enoque Alves Rodrigues

Bem em frente à Igreja Matriz localizada na Praça Jacinto Alves da Silveira, em pleno centro de Francisco Sá, conversavam Feliciano Oliveira e Montalvão, ambos, candidatos aos pleitos eleitorais de um ano qualquer, bem no inicio dos anos 1960.
O primeiro, meio alto e esguio, tez parda, careca, vestindo terno azul marinho com listras de giz, gravata borboleta - apesar do calor de deserto do Brejo das Almas de então -, e calçado com um par de botas de couro com canos longos que iam até os joelhos.
Já o segundo personagem, baixo, loiro, olhos claros, barriga saliente, calça de brim azul batido, camisa branca amarrotada, igualmente calçando botas de canos longos, num estilo bonachão, ensaiavam o discurso que fariam, logo mais, em um comício qualquer, lá no povoado de São Geraldo.
Eram velhas raposas da política do norte de minas, sendo o primeiro candidato à deputado federal e o outro a deputado estadual.
Dentro da Igreja aonde ambos se encontravam defronte, o Padre Silvestre, naquele momento, já se preparava para mais uma homilia. Fiéis assomavam-se à praça, tocados em seus recônditos pela “fé que remove montanhas”.
O Padre Silvestre, para quem não o conheceu, era um senhor alto, loiro, olhos azuis e, acreditem, muito sistemático. Diziam até que ele neste ultimo quesito conseguia superar, e muito, até mesmo o padre Salu, que todo brejeiro antigo só de ouvir falar o nome, tremia. O Padre Salu, sobre cuja personalidade difícil, já discorri neste espaço, realmente não era uma “boa ovelha”. Ranzinza, chegava muitas vezes ao extremo de expulsar as beatas de frente de seu confessionário a chutes. A molecada fugia dele.
Pois bem, o Padre Silvestre, a quem conheci de perto, não tinha, com toda certeza o temperamento do Padre Salu. Ao contrário, era dócil, tranqüilo, falar manso e um coração bondoso. Tratava a todos com amor e elevado espírito de solidariedade. Mas então, onde é que os dois padres se pareciam tanto? Pois não, os dois se assemelhavam devido ao fato de detestarem política.
Achavam. Achavam? Não, tinham certeza, assim como a temos nós hoje, que na política brasileira se escondem as maiores mentiras. Que o fator que fomenta a política é a mentira. E, claro, como Cristãos, e sendo a mentira um dos sete pecados capitais, eles, assim como todo e qualquer cidadão de bem, tinham mais é que abomina-la. Até ai, nenhum problema, não fossem os extremos.
Os dois grandes expoentes da política mineira palestravam descontraída e discretamente, já no meio da pequena multidão que se formava na praça. Ambos tinham o nítido desejo, mineiramente disfarçado, de à maneira que os brejeiros se ajuntassem todos, os dois candidatos, meteriam a mão em um bornal que traziam à mão e... zás... de lá sacariam um santinho com suas fotos e números e entregariam aos pretensos eleitores.
Mas o Padre era mesmo terrível. “Aquellos ojos verdes de mirada serena”, enxergavam mais que pirilampos do Mangal. À distancia e de relance, observava a ação dos dois, também, mineiramente. Fingia não vê-los. Os dois, por incrível que possa parecer, eram também amigos do padre Silvestre. Comungavam, ali. Mas o problema é que estavam fazendo política no lugar errado. No território do Padre. Era local sagrado. E isso ele não tolerava.
Não demorou muito e Feliciano puxou do bornal o primeiro santinho para entregar ao fiel eleitor. Tentou entregar, mas não conseguiu. Ao esticar a mão, pasmem. Assim como num passe de mágica, adivinhem de quem foi a mão que estava estendida para receber o santinho da mão de Feliciano Oliveira?
Sim. Foi ela mesma. Ao vivo e a cores: A mão do Padre Silvestre ali estava a tomar da mão de Feliciano o tal santinho.
Não contente, confiscou-lhe, sob os olhares surpresos dos fieis brejeiros, o bornal, cheio de santinhos.
Sem reagir, Feliciano, polido como sempre, mas também surpreso, apenas sorria...
Enquanto a Montalvão, evaporou-se em meio à multidão.
Pairam-me à mente, até hoje: jamais consegui entender como e de que maneira o Padre conseguiu levar a efeito toda esta ação, sem, sequer, proferir uma única palavra. Eu estava muito próximo e posso afirmar que ele não moveu os lábios.
Foram muito engraçadas e hilariantes as justificativas que os dois candidatos, algum tempo depois ao desembarcarem de uma velha Rural Willys já no povoado de São Geraldo, davam aos seus eleitores:
- “Olha pessoal. Viemos aqui falar com vocês, na condição de vossos leais e prestativos amigos de todas as horas. E todos nós sabemos muito bem que para se lembrar do rosto e da fisionomia de um amigo de verdade, aquele velho amigo que só nos faz bem, não se precisa de fotos. As nossas fotos, com toda certeza, já estão lá dentro da memória de todos vocês, nossos amigos. Mas para que não corram o risco de nos esquecerem, uma vez que a pinguinha do brejo que nós lhes oferecemos já está fazendo lá em vossas idéias, os seus efeitos, lhes informamos que o meu nome é FELICIANO OLIVEIRA. Eu sou o mais altinho e careca. Enquanto este aqui que está ao meu lado, baixinho e barrigudo, é o MONTALVÃO. Obrigado meus queridos amigos e correligionários e até a vitória nas urnas, se Deus assim o permitir!”
É...
Por vezes, quando não se tem a certeza necessária, é melhor abrir o jogo, sem delongas.

Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.

sábado, 15 de janeiro de 2011

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ XV - UM POUCO DO DR. JOÃO ALVES EM MONTES CLAROS – 4

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ XV- UM POUCO DO DR. JOÃO ALVES EM MONTES CLAROS 4

Enoque Alves Rodrigues

Logo após a primeira guerra mundial, os miasmas das epidemias espalharam-se pelos quadrantes do mundo! Assemelhava-se aos anos da “peste negra” na idade média! Era a “gripe espanhola”!

Em Montes Claros, a Santa Casa não cabia mais doentes! Mas o Dr. João Alves tratava deles no seu próprio lar! O povo, salvo por ele do amplexo frio da morte, ofereceu-lhe uma recordação: um relógio de ouro com uma gravação na tampa!

De o Jornal “Montes Claros”, de 10 de Abril de 1919, consta o seguinte trecho:

“A SAGRAÇÃO DE UM BENEMÉRITO. A CIDADE DE Montes Claros manifesta ao Dr. João Alves a sua gratidão pelos inestimáveis serviços por ele prestados durante a pandemia de gripe espanhola. Oferta de uma rica jóia ao Dr. João Alves. PRIMUS INTER PARES.
“De há muito projetava-se uma grande manifestação popular a este apostolo abnegado da caridade sertaneja, que em sua rota pela existência nada mais tem feito senão minorar a dor física, proporcionando a paz de espírito, tão necessária a luta pela existência.
“Ninguém certamente, certamente a esta manifestação se tornou Maximo credor, senão o Dr. João Alves, o medico da pobreza, que não contente dos desvelos e cuidados prestados aos pobres que a ele recorrem, dá-lhes também o necessário para o alivio da dor.
“Esta manifestação foi a apoteose dos seus incontáveis méritos. O Dr. João Alves é a figura de destaque do Norte de Minas – médico ilustre, político abalizado e dos mais temíveis, porque sabe dominar com rasgos varonis, arrebatando, empolgando, dominando o adversário, é o Presidente da Câmara Municipal de Montes Claros, o pró-homem, o eixo da política da terra que teve a ventura de o criar e que o viu crescer.
“Ao estudarmos a personalidade política do Dr. João Alves, encontramos nele todas as virtudes do ilustre caudilho gaúcho, o eminente político que chamou-se João Gomes Pinheiro Machado. Ninguém resiste à fascinação de João Alves; bom, justo, humanitário, ele vence a golpes de modéstia, natural simplicidade de sertanejo culto, e com um sorriso hábil, político, irresistível, que é uma claridade esmagadora, domina, empolga. Político de descortínio seguro, João Alves tornou-se o árbitro da política local, o seu desejo impera, é lei; e tudo que possui, avassaladora, que entra pelos lares, em alvoradas de trabalhos e aleluias de carinhos. E porque João Alves é tudo isto? Porque tem a estima de seus pares, porque sabe amar e é amado pelos filhos, e esposa desvelada, a distinta senhora dona Tiburtina Alves, sua inseparável companheira da caridade, tipo da mulher espartana, que empunhava as armas e dizia aos filhos: “parte, ide defender vosso pai, nosso tesouro querido”.
“Nas manifestações múltiplas, recebidas por João Alves, não podemos deixar de destacar as do Sr Major Prates Sobrinho, seu adversário político, cujos conceitos foram verdadeiros hinos ao cavalheirismo, ao mérito e ao civismo do ilustre manifestado, e será sem duvida alguma, o mediador plástico das questões do Norte de Minas."

Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil. http://enoque.rodrigues.zip.net/index.html; http://twitter.com/Enoqueal

sábado, 8 de janeiro de 2011

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ XIV - UM POUCO DO DR. JOÃO ALVES EM MONTES CLAROS - 3

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ XIV - UM POUCO DO DR. JOÃO ALVES EM MONTES CLAROS - 3
Enoque Alves Rodrigues

O Dr. João Alves era o santo da terra, o “Bom Samaritano”, que distribuía a ciência de curar com um simples rabisco de papel. Receita dada por aquele médico – dizia o jeca – “era como água na fervura”; o doente ficava limpo de uma vez!
Certa ocasião, um “tabaréu” virou-se para ele, no consultório, e recitou o seu rosário de moléstias:
- “Pois é assim, seu dotô, a Maria sente u’a pontada danada nos peito que arresponde nas costa. Daí entonces, ela cumeça numa tremedeira, lança tudo que cumeu e num agüenta mais nem u’a gata pro rabo. Eu quiria que mecê arreceitasse u’a mezinha pra ela...”
- “Ora, Juca, nós havemos de dar um jeito na Maria. Não se incomode, pois ela ficará boa logo...” – respondeu-lhe o Dr. João Alves, carinhosamente.
Dito assim, sentou-se frente a sua mesa de trabalhos, colocou o “pence-nez”, pegou da pena e receitou a “mezinha” para a Maria. Levantando-se todo sorridente, com aquela sua maneira muito peculiar que tanto cativava qualquer um, deu um tapinha nas costas do Juca e entregou-lhe a receita dizendo-lhe:
- “Pode ficar tranqüilo... É só usar isto aqui. Até outro dia. Vá com Deus, Juca. Não se esqueça de me mandar noticias da Maria...”
O Jeca, meio acanhado, virou-se para o médico:
- “Hoje eu num tenho dinheiro pra pagar mecê...”
- “Ora, Juca, só o que me faltava” – Exclamou o Dr. João Alves, sorridente. Quem falou aqui em dinheiro? Outro dia... Quando você puder...”
- “Antonces, seu dotô, até mais vê. Deus qui pague mecê...”
E lá se foi o jeca!...
Chegando em casa, na roça que ficava em Cana Brava, pegou da receita e lembrou-se das palavras do médico: costurou o papel da receita dentro de um pedaço de pano morim, formando um “patuá”, amarrou um barbante numa das extremidades e colocou aquela “relíquia” no pescoço da Maria!
Afirmam os próprios médicos que a sugestão tem curado muita gente pelo mundo afora: dentro de dois dias, se é que levou tudo isso, a velha Maria andava pela casa toda bendizendo a hora em que Deus se lembrara de por no mundo um medico como o Dr. João Alves!
Quando algum parente ou amigo das redondezas se sentia febril ou desanimado, Juca levava o famoso “patuá” e recomendava-lhe:
- “Ô cumpade, põe isso aqui no pescoço e vai vê... É tiro e queda. É remédio de sô doto João Arves...”

De outra feita, a cidade de Montes Claros dormitava serena sob a abóbada celeste crivada de estrelas. Um tropel de cavalo, aquela hora, aproximava-se da residência do já famoso médico, arrancando fagulhas, com as ferraduras de grande rompante, no calçamento “pé de moleque” da cidade. À frente da casa, a animália parou, um homem desceu dela e amarrou o cabresto naquela arvore copada. Em seguida, bateu à porta:
- “Dr. João Alves! Dr. João Alves””
Daí a questão de minutos, a chave rangeu na fechadura e o médico em pessoa assomou à porta.
- “Que deseja o senhor?” – indagou.
- “Eu sou Antonio Ramiro, seu doutor – respondeu o desconhecido. Vim trazer uma noticia para o senhor: quando passava pelas imediações da fazenda das Canoas, notei um movimento estranho por lá. Aproximei-me. Era o coronel Marciano Alves que fora assassinado” Então, vim oferecer os meus préstimos...”
O Dr. João Alves era também um grande psicólogo. Por isso mesmo, uma centelha de desconfiança se apoderou logo dele! E tinha razão: era o próprio Antonio Ramiro o assassino de seus pais! Ele chegara, sorrateiramente, aos arredores da casa grande. Ali devia haver muito dinheiro, pois o coronel era tido como avaro e devia ter a “burra” sempre cheia. Matou o fazendeiro e sua esposa! Diziam que jogara os cadáveres no chiqueiro de porcos! Com o grunhido medonho dos suínos, a donzela acordou, viu a cena e enlouqueceu!
Muitos e muitos anos depois, aquela antiga donzelinha do solar do coronel Marciano Alves gritava da janela de sua casinha, mesmo ao lado da do famoso medico:
- “João José! João José! Pega aquele malvado!”
As carnes de seus dedos já estavam dilaceradas, apodrecidas, porque ela enrolava-os, por mania, em trapos de pano molhados em água fria!
- “Que tem você nos dedos, Dona?” – Perguntavam-lhe os meninos que passavam em frente a sua casa em direção ao Grupo Escolar.
- “Ah!... – gemia ela. São umas agulhas que aquele malvado enfiou nos meus dedos... Só tenho alivio molhando-os em água fria...”
Ela fora uma moça fina e educada! De vez em quando, surpreendia a todos com uma melodia antiga, daquelas que se cantavam nos serões da família Alves!...
Eram romances que tinham vindo de Portugal, contando os amores infortunados das castelãs...

Vejam mais em meus blogs: http://www.blogger.com/home?pli=1
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Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

SAUDADE BREJEIRA - FRANCISCO SÁ

SAUDADE BREJEIRA

Enoque Alves Rodrigues

O sol brilhava intensamente lá pelos altos da Serra do Catuni. Seus raios fortes ultravioleta lambiam, solenemente, a barriga da bela serra, marco de beleza sem igual que identifica as lindas paisagens do Velho Brejo das Almas, onde os muares ainda ruminavam o banquete noturno.

Eram 7 horas de uma linda manhã do inicio do mês de Setembro.
Nas ruas, ainda de terra batida, o vento uivava com a intensidade de um vulcão, levantando nuvens de poeiras vermelhas, que adentravam, sem prévio convite, os pequeninos casebres de então, o brejeiro, pacato, cuidava de seus mais simples e comezinhos afazeres. Todas as pessoas já se encontravam em clima de festa. aproximavam-se as comemorações dos padroeiros do pequeno lugarejo aonde todas as almas se encontram e reverenciam. A euforia e as expectativas para os tres grandes dias de festas, afloravam-se.
É a vida seguindo lentamente o seu curso. Lento e natural. Ninguém tinha pressa...
No casarão, imponente e arejado, o mais importante do lugarejo, Jacinto Silveira e Maria Luiza, cuidavam da educação de sua prole. Os meninos tinham que crescer em um ambiente Cristão e saudável para seguirem seus caminhos. Geraldo Tito e Olyntho já manifestavam naquela tenra idade, suas inclinações para as letras.
No vasto alpendre da sala, Jacinto confabulava com seus correligionários saboreando um cafezinho mineiro acompanhado de broas de milho, preparando-se para mais um pleito eleitoral de novembro que se avizinhava, Maria Luisa, sua doce e fiel esposa, em um dos muitos quartos da casa, dedilhava um velho piano do qual arrancava maravilhosas sinfonias de Beethoven.
Enquanto isso, lá na velha Matriz do Brejo, o Padre Augusto Prudêncio se preparava para mais uma missa. Os fieis já estavam a postos, ávidos pelos seus sermões.
Na lagoa das pedras, com suas águas claras e cristalinas de um azul que refletia tal qual espelho as imagens das arvores e bovinos, peixes, marrecos, marrecos, ariris e patos nadavam, despreocupadamente.
Nos dois riachos as lavadeiras cantarolavam musicas nativas do lugar enquanto ensaboavam suas roupas antes de batê-las sobre uma pedra, no instante em que seus maridos desciam a Serra do Mocó, retornando de mais uma cansativa e frustrada noite de caça aos tatus. Eles não tinham a mesma sorte do lendário “Zé Tatu”, o antigo e o mais bem sucedido caçador desse espécime do Brejo. Ele tinha coleções intermináveis de cascos para confirmar a veracidade de seu sucesso neste tipo de caça.
Em Lagoa Seca, Rosalino cuidava de seu gado. Muito leite para tirar. Muitas vacas com suas crias amarradas as pernas e muitas outras prenhes.
Olympio Dias palestrava com seu grande amigo e correligionário Deputado Camilo Prates, sobre as pretensões de seu filho Alfredo Dias em ingressar no mundo da política. Sonho frustrado pela vida boemia interrompido que fora com sua morte, inconseqüente.
Lolô do Mangal, baixinho e barrigudo, feio de dar dó, preparava-se para praticar mais uma boa ação. Era feio somente por fora, pois dentro daquele peito rudimentar pulsava o mais bondoso coração do brejo. Ajudava a todos, indistintamente.
Lá em Cana-Brava, ás 5 horas da manhã, José Dias Pereira, o Zeca Guida, batia numa velha enxada à guisa de sirene, com seu vozeirão inconfundível, acordava os homens para mais um dia de trabalho: vamos trabalhar, vagabundos...rapadura é doce mais não é mole. Aqui tem que se comer o couro para se cagar correias. Grande Zeca. Matuto. Rico e bem sucedido, mas enérgico, complacente e caridoso.
Alheios a vida brejeira, até então, pois viviam em outro distrito que naquela época não pertencia ao Município de Brejo das Almas, cresciam robustos, na Fazenda Brejo de Santo André, em um lar farto e culto, os meninos Francisco e Alfredo Sá, que futuramente, com toda elegância, humildade e impar sabedoria, se encarregariam de levar aos quatro cantos do Planeta, o nome daquele torrãozinho, até então esquecido lá nos cafundós do Norte Mineiro, tornando-o conhecido e respeitado, dando-lhe o lugar de destaque de há muito merecedor. Não é sem motivos que hoje, ou desde 1938, a antiga Cidade de Brejo das Almas, leva, com todo o mérito, o nome de um destes dois grandes Brasileiros: Francisco Sá. Se bem que ainda nos dias atuais, pairam sérias e oportunas controvérsias, sendo que uma delas, na minha pobre visão de “brejeiro autentico” é a de que não seria o caso de ter dado ao lugar o nome de quem lá viveu, lutou e morreu? De quem, possuindo, legalmente, como propriedades suas quase todas as terras onde se localizava o velho Brejo das Almas, desprovido de qualquer avareza mas dotado de grande desprendimento, desapego as coisas materiais e sentimento Cristão e Patriótico, abriu mão de tudo isso pelo simples sonho de ver sua terra e sua gente independentes e emancipados? Que em luta empedernida na qual entrou rico e saiu pobre, deu o sangue e sacrificou a própria vida? Que no afã de conseguir com que o lugarejo de Brejo das Almas se transformasse em Município construiu por sua própria conta e com dinheiro do seu bolso os prédios que o habilitaria ao pleito de Município?
Pois é. Esse sujeito, cuja história tenho a honra de conhecer de cor e salteado, é Jacinto Alves da Silveira, marido da Dona Maria Luisa Araujo Silveira, pais dos meninos Geraldo Tito e Olyntho Silveira e sogros de Zezé e Yvonne de Oliveira Silveira.
Então, ficamos assim: Jacinto Silveira é o cara...
E tenho dito!

Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.









sábado, 1 de janeiro de 2011

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ XIII - UM POUCO DO DR. JOÃO ALVES EM MONTES CLAROS 2.

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ XIII -UM POUCO DO DR. JOÃO ALVES EM MONTES CLAROS 2

Enoque Alves Rodrigues

No mesmo Jornal “Folha do Norte”, em seu número de 27 de Julho do ano de 1930, cujo periódico era naquela época publicado em Montes Claros e distribuído para toda a região do norte das Minas Gerais, viam-se os seguintes artigos:
“Estão sendo, afinal, vitoriosos no Supremo Tribunal todos os pontos de vista sustentados pelo “O Jornal” e o “Diário da Noite” a propósito de Montes Claros. Os juízes que votaram até agora no conflito de jurisdição provocado em virtude de presença inepta de um procurador da Republica no inquérito policial instaurado pelo governo de Minas, todos dois já opinaram que não se trata de crime político. A justiça se acha diante de um delito comum submetido à jurisdição da autoridade judiciária local. Vemos desse modo, posta em cheque a palavra do presidente da Republica, que na mensagem enviada a 3 de maio ultimo ao Congresso, teve a impávida coragem de classificar como político a reação ao autonomistas de Montes Claros às provocações feitas pelo governo federal ao brio, ao pudor e ao caráter altivo dos mineiros.
“Quando ocorreram os deploráveis acontecimentos de Montes Claros, frisamos desde a primeira hora que o pais assistia ao gesto de desespero de uma coletividade, nos derradeiros transes da paciência e do espírito de sacrifício. O que a tolerância mineira contemporizou com a insolência desabusada do Sr. Washington Luiz e dos seus instrumentos covardes, só poderá ser bem compreendido examinando-se friamente a explosão de Montes Claros. O trágico morticínio que ali se verificou foi como uma válvula de escapamento da pressão formidável da temperatura mineira, contra homens como os senhores Washington Luiz, Carvalho de Brito e Melo Viana, que todo o dia procuravam um pretexto novo para enxovalhar a dignidade da gente altiva de Minas Gerais.
“Uma bomba lançada por um imprudente da caravana do Prestes, à porta da casa do Sr. João Alves, foi o estopim que ateou fogo na dinamite. Os líderes da provocação à bravura mineira saíram, graças a Deus, com vida para que a Nação evidenciasse a mistura de que era feito o caráter desses cidadãos que o Sr. Washington Luiz adquiriu para com eles ter a veleidade pueril de intimidar o liberalismo montanhês. Face a face dos autonomistas intrépidos de Montes Claros, todos eles exacerbada pelas agressões do poder federal às liberdades publicas de sua terra, - os líderes da causa do mandonismo do presidente da Republica, em Minas, não tiveram sequer coragem de enfrentar as escopetas das suas vitimas, decididas à revanche pessoal, corpo a corpo. Os senhores, Brito, Melo Viana e outros próceres concentristas receberam o contra-golpe dos autonomistas de Montes Claros de ventres colados ao solo, pálidos de susto para serem pisados, machucados pela sua caravana em debandada, a fugir estrada afora, como folhas secas varridas pelo vendaval.
“Montes Claros fixa no momento culminante da consciência brasileira.
“As palavras do juiz Artur Ribeiro são o mais tremendo libelo que poderia ouvir o presidente da Republica, a propósito daquela frase pernóstica “tocaia de bugres”, com que quis ele classificar Montes Claros. Insistiu o Sr. Artur Ribeiro no que sempre aqui dissemos: foi o sentimento da autonomia individual e coletiva que ditou aquele ato de desespero. Tenhamos coragem de pegar pela gola do casado e apontar à Nação o único responsável pela chacina verificada naquele reduto das liberdades mineiras. É o Presidente da Republica a quem o voto do Supremo Tribunal irá colocar, desta vez, em triste e miserável postura”
(Assinado) Assis Chateaubriand”

Breve, na medida do possível darei seqüência a historia de vida desse grande Brasileiro, que nasceu e viveu com grande galhardia no norte das Minas Gerais e que tanto fez por Montes Claros, Francisco Sá e toda região.


Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.