sexta-feira, 23 de julho de 2010

CENAS BREJEIRAS V – POLICARPO TAIOBA, O VAQUEIRO

CENAS BREJEIRAS V – POLICARPO TAIOBA, O VAQUEIRO


Enoque Alves Rodrigues

Policarpo Taioba era um vaqueiro que vivia em Francisco Sá, no Brejo das Almas de antanho.
Chapéu de couro com jugular, botas, gibão e um inseparável chicote fundiam-se à sua própria personalidade. Em todos e quaisquer lugares por onde o encontrasse, lá estavam esses apetrechos colados ao seu corpo como se com ele tivessem nascido. Parecia algo congênito.
Nascera, na verdade, em Taiobeiras, mas, ainda criança transferiu-se com toda sua numerosa família para Francisco Sá, Brejo das Almas. Viviam em um pequeno casebre bem no inicio da antiga Rua Padre Augusto. Dona Dezinha, sua mãe, uma senhorinha já beirando os 70 anos era uma biscoiteira de primeira linha. As suas fornadas eram vendidas por dois de seus filhos menores, o Edgar e o Gino, no Mercado Municipal.
Durante toda a semana, Policarpo passava embrenhado nas fazendas de meu padrinho Rosalino, próximo a Lagoa Seca, na lide da ordenha da vaquejada e no pastoreio da bizerrada nos pastos verdejantes. Aos Sábados, retornava ao Brejo quando eu também saia de Terra Branca, fazenda de meu avô, para fazermos as nossas ingênuas, infantis e despretensiosas farras que consistiam em tomar umas “crushes”, refrigerante da época, nos bares do Brejo e depois, já com outros rapazolas, irmos nadar nos dois riachos. Bons tempos, aqueles...
Aos domingos, a diversão era muito rara. Não podíamos repetir a rotina do sábado. Como naquela época poucas eram as famílias que possuíam aparelhos de televisão em casa, toda a petizada ia para o lugar onde eu ficava hospedado, ou seja, para a Pensão da Dona Quino, que ficava na rua, hoje alameda principal, onde quase todos as linhas de ônibus faziam seu ponto final. Lá, naquele velho casarão esverdeado, diante de um não menos velho televisor branco e preto, cuja tela era fixada em uma caixa de madeira, curtíamos os programas de então.
Víamos e não conseguíamos entender como o jovem Silvio Santos tinha tanto dinheiro para que, postado diante de uma interminável fila de vemaguetes, cordinis, rurais e outros carrões da época, realizar a distribuição gratuita a tantos de seus agraciados com essas verdadeiras fortunas capazes de uma só delas, fazer a felicidade de qualquer simples mortal. Belos tempos... Lindos dias, dizia a música do Rei Roberto, fazendo jus aquela ocasião.
No mesmo Canal o Velho Guerreiro fazia vasta distribuição de bacalhau, abacaxis e bananas. Por alguns instantes dava-nos a impressão de estarmos em uma feira livre.
Sentado em um diminuto banquinho de madeira o nosso vaqueiro Policarpo, em sua já mencionada e inseparável roupagem de couro, observada tudo como se estivesse anestesiado.
- Uai, Policarpo, não está gostando da programação de hoje?
- Não é isso não, Noquinho! Faço muito gosto dessa programação, moço! O que eu num consigo entender é a bondade do Sirvo Santo. Como ele tem um coração tão grande assim, moço!
- Coração tão grande? Uai, Policarpo, mas do que é que você está falando, moço?
- Uai, Noquinho, você ainda não entendeu? Por acaso você já viu argúem puraí dando quarqué carro de presente pra outro? Isso não existe em nenhum outro lugá! Só mesmo ai na televisão, c’um Sirvo. Ele é muitcho bacana. Carqué dia desses vô lá em Su Paulo pra pidi um pra ele!
- É...
- Dissestes bem, Policarpo. Somente na televisão se pode ver tanta bondade...
Na prática, por vezes, a teoria é outra.
Inté...
Enoque Alves Rodrigues é divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas e atua nas áreas de Engenharia Civil, Pesada, Obras de Artes, Montagens Industriais e Grandes Estruturas.

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