Precisava se despedir agora do Seminário, galgar a serra e tomar o rumo do sertão de Minas. Era mais outra família que ele deixava para trás. À porta estavam aglomerados os mestres queridos. Como na despedida de Montes Claros, há 12 anos atrás, abraçou a cada um ternamente, com uma lágrima furtiva umedecendo-lhe os olhos atrás dos óculos...Galgando o lombo de uma besta, foi abanando de novo o seu lenço branco, despedindo-se dos entes queridos, até que a alimária sumiu-se numa encruzilhada do caminho...
Enquanto a mula andava naquele passo cadenciado pelas serranias afora, o agora Padre Augusto ia passando pela recordação, os colegas de Seminário: Justiniano Fernandes de Azevedo, Honório Benedito Otoni, Antonio de Souza Neves, Álvaro da Mata Machado, Genesco Alves Pereira, Antonio Augusto Versiani, Antonio Homes da Silva Chaves Jr., José Gomes da Silva Chaves, Antonio Francelino Lafettá, Feliz Antonio de Souza Brandão, Teófilo Vieira de Andrade, Davi Eloi Otoni, Francisco Augusto Alkmin, Assis Moreira da Silva, Herculano dos Santos Mourão, Augusto Clementino da Silva, Maximiliano da Silva Rolim, Sabino Barroso, José Ferreira de Andrade e Edmundo Lins...
A primeira missa deve ser o marco inicial na vida de um sacerdote católico. Como o soldado ao receber o batismo de fogo, é diante do altar que ele toma verdadeiro contato com as coisas Divinas, relembrando principalmente o sacrifício tremendo que se desenrolou pelas ruas da Sagrada Jerusalém, até o final doloroso do alto do Calvário.
Diante do altar da religião que abraçou, o jovem sacerdote sente uma tensão extraordinária! Com o pensamento, percorre os primórdios da humanidade, vindos de Adão e Eva no Paraíso Terrestre, passando pelo Dilúvio Universal, até a chegada de Abraão vindo da Caldéia; de Jacó sonhando com a escada miraculosa que ia até a porta do céu; da região pastoril, suave e tranqüila onde ele chorou a morte de sua amada Rachel; dos sofrimentos e da grandeza de José, governador dos povos, de Moises com os hebreus no deserto; de Davi cantando os Salmos aos acordes de sua lira; da grandeza do rei Salomão e dos pórticos grandiosos dos templos de Jerusalém; finalmente, de Jesus a pregar diante das turbas de Judeus que O levaram ao sacrifício redentor da Cruz!
Aquela data de 16 de agosto de 1879 ficaria gravada indelevelmente nos corações daquela gente, pois nada mais providencial, aos sentimentos do povo antigo, do que receber a benção de um sacerdote da própria terra sobre a qual Deus lançara o seu olhar e a centelha do Seu amor!
Vestindo uma batina nova, de tecido brilhante, colarinho rendado e um barrete de três bicos, o Padre Augusto saiu de casa acompanhado de uma grande multidão de povo. Cada qual queria ter a primazia de estar junto dele! Ao chegar a porta da Igreja, uma fila de meninas saúda-o atirando-lhe pétalas de rosas!
A Igreja era pequena para os amigos e fieis! Paramentado, galgou ele os primeiros degraus do altar! Naquele instante, querendo retroceder o pensamento às coisas do passado, suas idéias avançavam, no entanto, para os dias do futuro, mostrando-lhe antecipadamente a árdua missão que lhe fora destinada!
Sempre tivera uma atração especial pelos pequeninos, menos favorecidos e abandonados, sem pai e sem mãe, filhos espúrios da adversidade, criados à mercê do vicio e da corrupção, assim como o Divino Mestre se compadecia das mulheres perdidas!
Enquanto outros menos escrupulosos se compraziam em galgar postos na carreira sacerdotal, aquele tinha em mira o amparo ao menor abandonado, aos sofredores, tendo como modelo o imortal São Vicente de Paulo. Assim foi que, durante a cerimônia de sua primeira missa, se viu transportado em espírito aos paramos infinitos aonde viu centenas de criancinhas vestidas de branco e cercando com alegria o Mestre Divino!
Aquela visão impressionante talvez fosse a trilha que o Senhor traçava para ele, aceitando a sua vocação de pai adotivo de dos filhos sem nome, pois Ele próprio não dissera quando os discípulos O afastavam das crianças, que estas são o Reino dos Céus?
Quando pronunciou a ultima silaba da liturgia da Igreja, naquele instante exato, o antigo pupilo do Cônego Chaves entrava verdadeiramente na carreira sacerdotal que tanto dignificaria durante mais de meio século!...
No próximo sábado, 23/01/2010, estarei dando inicio a narração de sua transferência para São Gonçalo de Brejo das Almas, hoje, Francisco Sá, “beldade do norte de Minas”, onde exerceu por mais de 40 anos o mais puro sacerdócio.
Um grande abraço “brejeiro” para vocês, meus conterrâneos!!!
Enoque A. Rodrigues, de São Paulo, SP.
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