sábado, 30 de outubro de 2010

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ VI – ZEZIM TOCADOR E VAZAMUNDO

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ VI – ZEZIM TOCADOR E VAZAMUNDO


Enoque Alves Rodrigues

Braços curtos, baixinho e barrigudo. Com dois reluzentes dentes de ouro na arcada superior da boca. Camisa estampada sempre desabotoada, deixava à mostra uma musculatura peitoral má nutrida e bastante judiada pelo passar dos anos implacáveis. Calça arranca toco amarrada na cintura, sem cinto. Sandálias franciscanas aos pés e, na cabeça, um velho e surrado chapéu de couro com três estrelas sendo a maior delas situada ao meio, no estilo Lampião. Lenço vermelho sujo no pescoço. Sanfona de oito baixos colada no peito como se com ele tivesse nascido. Cão preto de olhar tristonho e distante, cujo nome, “vazamundo”, fazia jus aquele seu olhar para alguma imensidão desconhecida do planeta. Pronto: estava, ali, na frente de tudo e de todos, formado o mais perfeito trio que naqueles tempos era o principal, ou melhor, o único responsável pela alegria que contagiava as tardes, noites e manhãs Brejeiras. Sim, Francisco Sá, Minas Gerais, Brasil, ou, o “Velho Brejo de todas as Almas”, deitava, acordava e levantava ao som daquela sanfona. Não é preciso que o leitor tenha muita idade para se lembrar do que estou narrando, afinal, refiro-me a década de 1970.
Zezim era exímio tocador. Sanfoneiro dos bons, cujo repertório vasto e eclético o permitia passear por todos os ritmos. Ia do Rei do Baião, Luiz Gonzaga ao Rei do Iê, iê, Iê, Roberto Carlos, em frações de segundos. Bastava apenas que alguém de entre o respeitoso publico solicitasse que em ato continuo e simultâneo, os dedos rústicos e calejados por outras lides, mais sempre ágeis, daquele autentico brejeiro, em sintonia perfeita com o limitado teclado, dedilhava-o em uma maestria inimaginável aos olhos humanos, ainda mais quando se sabe que nenhuma instrução tivera antes aquele homenzinho. É muito simples para os céticos que atribuem todo e qualquer fato anormal as coincidências naturais, ignorarem que tamanha aptidão não tenha sido dada aquele matuto pelas mãos da Divina Providência. Mas certo está que é desnecessário ter fé elevada para não duvidar disso: Zezim Tocador foi designado pelo lado de lá, para vir ao mundo alegrar a gente brejeira. Os “Caras lá de Cima” quando lhe enviaram  para cá, sabiam muito bem o que estavam fazendo. Que não havia no Orbe Terrestre localidade mais triste e melancólica e tão carente de um pouco de alegria ou bagunça mesmo, que o velho Brejo das Almas. Aí mandaram Zezim e de quebra o seu cão vazamundo que contracenava com o sanfoneiro, pois enquanto ele dedilhava a velha sanfona, vazamundo, independente da musica que seu dono estava a tocar, punha-se a latir sem parar, como se estivesse o acompanhando em cânticos.
Zezim, ao contrário do que todos imaginavam, não possuía somente uma sanfona. Ele tinha várias. Dizia que um homem prevenido vale por dois, por isso mantinha outras sanfonas para a eventualidade de substituir alguma que apresentasse problemas, afim de não deixar a gente brejeira sem um “sonzinho”. Mas convenhamos, gente boa, divertíamo-nos somente até certo ponto. Porque dia e noite ouvindo aquelas melodias muitas vezes acompanhadas, ao longe, pelo cantar triste das cigarras, transformavam-se, pelo cansaço enfadonho da oitiva permanente das cantilenas, tudo isso, no mais tenebroso martírio. Eram tristes, bem verdade, as tardes, noites e manhãs brejeiras. Precisavam de alegria. Mas “tudo de mais é sobra, uai” assim falamos nós mineiros.
Bem, eclético na musica, eclético na vida. Pois é, Zezim desenvolvia outras atividades que nada tinham a ver com o mundo de Ludwig van Beethoven. Preparava nas horas vagas garrafadas de raízes das quais era ele doutor no conhecimento e as doava para a gente carente de um Brejo das Almas sem farmácias. Ele tinha também “algum negócio” com o invisível, pois era muito solicitado a visitar as fazendas e sítios da região com a única missão de “expulsar cobras” que disseminavam pavor e prejuízos às manadas nas matas e pastagens dos fazendeiros de então.
Pequeno no tamanho, grande na vida. Seria necessário muito mais tempo para que eu pudesse descrever o que foi Zezim Tocador e seu cão Vazamundo para Francisco Sá, naqueles já longínquos tempos.
Inté...
Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.
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sábado, 23 de outubro de 2010

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ V – GERALDINO FOGUETEIRO

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ V – GERALDINO FOGUETEIRO
Enoque Alves Rodrigues

Ele vivia num velho casarão bem no inicio de onde hoje é a Rua João Catulino Andrade, em pleno centro. Já não sabia mais o que fazer. Até ali, tudo dera errado em sua vida. O pai, Antonio Carlos havia abandonado sua mãe quando ele ainda era menino. Sequer conseguia lembrar-lhes à feição. A mãe, Maria Lavadeira, sustentou-o, enquanto pode, com o oficio que galhardamente levava no sobrenome. Várias famílias razoavelmente abastadas do antigo Brejo das Almas davam-lhe suas vestimentas de época para serem lavadas. Trouxas e mais trouxas eram batidas com sabão em forma de bola, feito do mais puro sebo de boi, sobre uma já lisa e desgastada pedra, colocada estrategicamente pela mãe natureza nas barrancas do rio São Domingos que nasce na serra do Catuni. Geraldino, sim, este era o seu nome, pequenino a acompanhava nesta lide. Enquanto a mãe Maria batia as roupas sempre a cantarolar alguma cantiga nativa do velho Brejo, ele postava-se em curta distância da mãe com uma pequena vara com um mínimo anzol a ponta de uma linha, onde pescava algumas piabas que ali mesmo eram assadas sobre uma pequena pedra aquecida com fogo. Lá mesmo, ou seja, na beirada do rio, as consumiam.
Muitos anos depois, Maria Lavadeira, depois de uma grande história de vida e amor ao Brejo, partiu desta vida deixando nosso Geraldino só. Não tinha nenhuma profissão que pudesse suprir sua subsistência. Foi ai que o amigo Caetano Dias, cuja família hoje é tradicionalíssima do lugar, ofereceu-lhe aquilo que se poderia chamar de a “grande chance”: Fabricar foguetes. O Brejo das Almas, hoje ou desde 1938, Francisco Sá, sempre foi muito festeiro. Deve isso a várias comemorações de uma infinidade de santos que o apadrinham.
Bem, como vinha dizendo, Geraldino vivia à beira do desespero. Não obstante ter obtido algum sucesso no fabrico de fogos, quando ainda jovem, agora estava velho e quase acabado e, o pior, com a nítida sensação de que passara toda a vida trabalhando sem resultado. Não conseguira fazer sequer um pequenino pé de meia. Lamentava o fato de não ter se casado e a ausência de filhos. Puxa vida, dizia, se pelo menos eu tivesse tido filhos quem sabe hoje algum deles pudesse me sustentar. Não agüento mais trabalhar. O corpo só pede descanso. Mas é ai que está o meu problema: cobra que não anda não engole sapo... mas como é que eu vou andar se sequer consigo levantar desta maldita cama?
Na manhã seguinte, como que num passe de mágica, levantou-se mais que disposto. Dirigiu-se até a velha fabriqueta de foguetes e em posição de extrema reverência pediu a quem estivesse “lá do outro lado” que o ajudasse a se erguer daquela vidinha miserável e sem graça. No afã de livrar-se de seu pesado fardo, ou quiçá na empolgação do momento, acabou prometendo o que talvez mesmo que vivesse uns trezentos anos jamais poderia cumprir: Caso conseguisse sucesso em sua trajetória de fabricante de fogos e se aquelas forças lhe devolvessem a sua saúde, disposição e jovialidade para que seguisse trabalhando, subiria, de joelhos, o morro do mocó e, de lá, em pleno cume, soltaria uma rajada de fogos numa manhã primaveril saudando todos os santos do mês de setembro.
Incrivelmente, passou a progredir. Encomendas eram feitas dos mais longínquos confins das Alterosas. Era lindo de se ver o vai e vem dos carros de bois descendo a serra com seus ressequidos cocões (quatro paus verticais que prendem o eixo dos carros de bois) a rangerem-se numa cantilena piedosa e ao mesmo tempo alegre em direção a agora grande e progressista “Fábrica Brejeira de Fogos de Artifícios”. Tropas de burros varavam o sertão durante a noite e na manhã seguinte já estavam pastando em frente a fábrica de Geraldino Fogueteiro, na cansativa espera do carregamento, para retornarem aos seus locais de origem.
“O homem cresceu. O homem mudou”, já dizia o poeta. Agora, rico, sequer pairava-lhe à mente quaisquer resquícios do que antes, no desespero prometera, sabe-se lá, para quem.
Pois bem, inesperadamente, do mesmo jeito que veio o sucesso, sem que nenhum fato relevante o justificasse, numa tarde triste e chuvosa, daquelas que antanho acometiam o velho Brejo das Almas, Geraldino, sem mais nem menos, como que por encanto, voou pelos ares.
Na chamada oral feita pelo professor Neco Surdo no Grupo Escolar onde Geraldino, já velho, estudava, na aula do dia seguinte travou-se o curioso diálogo narrado pelo grande e inimitável historiador Brejeiro Geraldo Tito Silveira:
- “Geraldino Fogueteiro...
- “Ele morreu queimado com pólvora, respondeu um espoleta qualquer, seu ex-colega de classe...
É...
Por vezes, dizia Shakespeare, “há mais coisas entre o céu e a terra do que supõe nossa vã filosofia”.
Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.

sábado, 16 de outubro de 2010

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ IV – OS VELHOS ENGENHOS DE CANA

ASSIM ERA FRANCISCO SÁ IV – OS VELHOS ENGENHOS DE CANA

Enoque Alves Rodrigues

Já se vão longe e saudosos os tempos em que havia em quase todos os pequenos sítios localizados no Município de Francisco Sá, Brejo das Almas, assim como em todo o norte das Minas Gerais, os velhos e barulhentos engenhos para moagem de cana de açúcar. Lembro-me, quando criança, que na Fazenda do senhor Liberato, meu avô,  havia um desses engenhos que durante a época da moagem sempre nos meses de Julho e Agosto, funcionava o dia todo, ininterruptamente.
A lide do velho Liberato, com ou sem moagem, se iniciava sempre ás 04:30 da manhã, quando ele levantava de seu velho catre em couro trançado onde repousava com a Dindinha Justina, minha avó, com um Hinário nas mãos, entoando um hino do qual não me recordo o titulo mas que iniciava mais ou menos assim: “vamos trabalhar...vamos trabalhar”. Todos ali, ao ouvirem esta “palavra de ordem”, levantavam-se, um a um, e acompanhavam-no em cânticos, seguindo todos juntos e irmanados, em direção a imensa sala de visitas que ficava na parte da frente do antigo casarão, aonde jazia uma tosca mesa de madeira coberta por fina toalha de linho branco, denominada “o altar da família”, e ali, em perfeita comunhão, punham-se a orar pedindo que as forças do bem os abençoasse para que tivessem um bom dia de trabalho e que não deixassem que nada de ruim lhes acontecesse. O velho Liberato fazia a leitura da Bíblia de maneira aleatória e depois a traduzia com uma fluência de vocabulário inenarrável, principalmente quando se sabe que aquele “velho matuto” jamais antes tivera qualquer contato com as letras. Os encerramentos destas sessões eram quase que sempre feitos por sua filha mais velha, minha tia Nira, com uma linda oração que lamentavelmente este espaço que me é facultado pelo Jornal MontesClaros.com, que publica minhas crônicas, não me permite estender sob pena de me classificar de fazer proselitismo religioso. Uma pena. Sem entrar no mérito mais traçando uma analogia, informo que estas orações de encerramento eram o mesmo que são hoje os DDS´s corporativos, ou seja, os Diálogos Diários de Segurança que são lidos pelos empregados na parte da manhã, antes de iniciarem suas atividades. Discorrem-se, sistematicamente, sobre os cuidados que o trabalhador deve tomar durante o dia. Recomenda enfaticamente o uso dos Equipamentos de Proteção Individual, etc. Enquanto que nos “DDS´s” de minha tia Nira, - lá na Fazenda “Terra Branca” de propriedade de meu avô-, feitos em forma de oração, se implorava apenas e tão somente pela proteção Divina, ao invés do uso de EPI´s (que não existiam por aquelas plagas).
Finalizada a cerimônia, saiam todos em silêncio, de maneira ordeira, numa fila indiana com meu avô a frente, rumo ao engenho onde já os esperavam o pessoal agregado que iria colaborar com a labuta. Ali já estava tudo preparado a espera do velho João Rodrigues para iniciarem as atividades do dia que mais pareciam Obras de Artes ou coisa derivada de algum quadro de impressionismo do Século XIX, que ainda hoje pairam de forma indelével em minha memória:
Quatro montanhas de canas cortadas no dia anterior cercavam o velho engenho já devidamente equipado com três juntas de bois em cangas aos quais fora dada a incumbência de fazer girar as rangedoras e barulhentas moendas no hercúleo esforço de triturarem, enquanto o dia clareava, aquele mudo de “madeiras doces” da família das poaceaes, do gênero saccharum. Ao lado do engenho três cabanas feitas e cobertas inteiramente com bagaços das próprias canas. Lá ficavam posicionados estrategicamente imensos tachos de bronze em fogo alto a queimar-lhes os fundilhos, que recebiam a garapa da cana que era retirada de um tanque depois de ter sido captada através de cochos que ligavam as moendas ao tanque e tinham como função convertê-la em estado sólido transformando-a em rapadura, melado ou puxa a esta ultima se adicionava a cidra ou cascas de laranja o que a tornava um fino doce dos deuses, quase tudo era vendido no Mercado do Brejo das Almas.
Aquele ritual deixava qualquer um encantado. Até mesmo o pessoal envolvido com aquela lide se orgulhava dela. Imaginem isso, na mente de um guri de oito anos. Era o máximo: mesmo pequeno, eu tinha lá minhas funções. Claro que dentro daquela rígida hierarquia as minhas atribuições eram as mais inferiores. Mais eu também era graduado. Quando eu não estava provando o melado para ver o ponto, estava enchendo o saco da “Dindinha” (avó), pedindo para adicionar logo a cidra ao melado para eu iniciar a comilança, ou então, postava-me no topo de  um dos muitos pés de manga e, uma vez  lá de cima, tentava infrutiferamente contar quantos giros aquelas juntas conseguiam dar em volta do engenho. Tonto e frustrado era sempre obrigado a apear dali sem que tivesse realizado meu intento. Já embaixo me ocupava de contar quantas viagens as pessoas conseguiriam fazer com seus bangüês carregados de bagaços de cana. Enquanto isso o guia dos bois com uma vara à mão que jamais era utilizada ia gritando: "Eh, boi... Formoso... Vamo queimado... Só mais um pouquinho... Contente... Vamos... Sobrero, cuidado... Do outro lado, meu avô feliz com a produção, alisando sua linda e cheia barba branca com as duas mãos (ele tinha esse costume), agradecia a Deus comovidamente aquelas dádivas: "Glória a Deus nas Alturas e Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade". Bons tempos, aqueles...
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Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.

sábado, 9 de outubro de 2010

MORREU GASPAR ALBÉRIO EM MONTES CLAROS

MORREU GASPAR ALBÉRIO EM MONTES CLAROS

Enoque Alves Rodrigues

Hoje, excepcionalmente não escreverei sobre Francisco Sá, a Cidade. Discorrerei, sinteticamente, sobre o grande homem que lá nasceu há 85 anos e que agora retorna aos Céus, chamado que fora por Deus em 04/10/10, em Montes Claros.
Trilhou, aqui na terra, todos os seus caminhos pautados sempre pela fé, dedicação ao próximo e, principalmente, por ter deixado a todos os que com ele conviveram lá em Capitão Enéas, exemplos de sinceridade, respeito, cordialidade, afeto e amizade na mais pura e sublime acepção da palavra.
Gaspar Albério, ou “Seu Gaspar”, soube como ninguém construir todos os laços que o uniam as pessoas e a sociedade de Capitão Enéas.
Estabelecido, há muitos anos nesta Cidade no ramo do Comércio, depois de haver se dedicado a várias atividades correlatas, entre elas, a de mascate, onde negociava seus produtos dentro do velho trem da antiga Rede Ferroviária Federal que cortava o norte das Minas Gerais.
Na condição de comerciante na Avenida Burarama, utilizava muito mais esta prerrogativa para conquistar novos amigos, granjear simpatias e consolidar velhas amizades, que para ganhar dinheiro. Todos que ali chegavam, com ou sem dinheiro, levavam o que queriam. Tudo, claro, anotado em sua velha caderneta ou muitas vezes somente na palavra.
-Seu Gaspar, eu gostei muito daquele tecido ali mais tô sem dinheiro hoje. O que é que a gente faz?
-Tem problema não, filhinha. Ocê pode levar que nóis acerta quando você puder. Ta me entendendo? Dito isso, pegava uma velha métrica em madeira, destas de se medir tecidos, e com uma não menos velha tesoura, dava um pequeno corte e zás...de uma só vez rasgava o restante em linha reta.
Enquanto isso entrava outro:
-Seu Gaspar, eu vim aqui para “acertar” aquela continha do mês passado.
-Mais como? Já meu filho?
-Espere um pouquinho, vou atender a filhinha ali. Enquanto isso senta um pouco e vamos proseando.
-Como vai a família? E aquele seu probleminha de saúde. Já resolveu com aquele remédio que você me falou da outra vez? E a porca já deu cria?
Evangélico durante quase toda sua vida, tinha ele o dom da palavra. Colaborava com todos a sua volta. Assumira na Sociedade Eneense posições de destaque que por si abalariam o ego de simples mortais. Jamais se deslumbrou com nada. Cuidava de duas irmãzinhas suas muito velhinhas e fragilizadas pelo decorrer dos anos que agora sentem-se orfãs. Todos os dias, impreterivelmente, ele atravessava a linha do trem e, do outro lado da Cidade ia estar com elas levando-lhes seu carinho fraterno e o conforto da palavra.
Seu maior orgulho: ter criado seus sete filhos todos íntegros apenas e tão somente com os seus exemplos de vida. Circunstancias naturais da vida, ou seja, a busca pela sobrevivência e melhores condições de vida, acabaram por empurrar para longe de seu convívio seus dois únicos filhos homens, restando-lhe próximos somente suas filhas mulheres que, naturalmente supria a falta dos outros, desdobrando-se em mimos e cuidados.
Jamais, em minhas crônicas fiz qualquer referência a este senhor. Entendo que da mesma forma que não devemos pronunciar o nome de Deus em vão, não existe palavra, por mais rico que seja o vocabulário, para qualificar com fidelidade sem o risco da hipérbole ou paixão, seres que a providência divina, de quando em vez, se encarrega de mandar para a terra. Principalmente quando fomos nós, diretamente agraciados com a dádiva de tê-los como parentes próximos.
Sim. Gaspar Albério Rodrigues, que faleceu em Montes Claros e que vivia em Capitão Enéas e que agora descansa em paz ao lado de Deus, era o meu querido pai. Que Deus o tenha em sua Santa Glória.
Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.




sábado, 2 de outubro de 2010

ISTO É FRANCISCO SÁ - HIDROGRAFIA - FINAL

Enoque Alves Rodrigues

Nascendo na Serra do Catuni, o Rio São Domingos passa pela Cidade de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais e segue seu curso em direção ao Rio Verde Grande, do qual é um dos muitos tributários. É relativamente pobre a rede hidrográfica do Município, já que vários dos seus córregos secam após a retirada das chuvas.
Quem demanda o lado norte, encontra o córrego do Carrapato e, em seguida, o Sitio Novo, o Ribeirão de Cana Brava, o Córrego Pau Preto, o do Brejão, o Mamonas, o Traçadal e ainda o Rio Quem Quem.
Do lado Sul, deparam-se com o Rio Boa Vista, o Vaca Brava, o Córrego dos Patos, o Rio Caititu, o Rio da Prata e o Córrego Rico.
Ainda ao Norte, em demanda ao povoado do Catuni, o Rio Gorutuba, que em vários pontos, forma belíssimas praias de areia clara.
O Rio Verde Grande é o marco divisório dos Municípios de Francisco Sá e Montes Claros.
Dentro do território do Município de Francisco Sá há varias lagoas. Á margem da rodagem Montes Claros – Salinas, depois do Rio Verde e a direita de quem parte de Francisco Sá, fica a bonita lagoa da Barra, na Fazenda de mesmo nome. O antigo proprietário Dr. Felix Pimenta de Carvalho, construiu a margem da lagoa um moderno Clube Campestre, no qual a Sociedade de Montes Claros bem como a de Francisco Sá, encontram um ponto magnífico para as suas atrações domingueiras.
Ao Nascente, na belíssima Cidade de Francisco Sá já quase inteiramente drenada, fica a histórica Lagoa das Pedras, ás margens da qual o Bandeirante Antonio Gonçalves Figueira, juntamente com os seus companheiros, acampou num dia de finados, conforme já escrevi, erguendo numa elevação ao lado o cruzeiro, do qual tiraria o primeiro topônimo do lugar, que fora o de “Cruz das Almas das Caatingas do Rio Verde”.
Os que conhecem esta lagoa no seu estado atual, não formam a idéia do quanto já fora bela. Quem teve o privilegio de conhecê-la em seus tempos de gloria lembra-se de que ali havia um lindo espelho d’agua. Praticava-se ali grandes e prodigiosas pescarias aonde se pescava arrobas e mais arrobas de peixes de várias espécies. Existisse hoje como antes, certamente daria um lindo lago navegável, onde a mocidade poderia esportivamente se divertir.
Distando três léguas do Centro de minha Cidade de Francisco Sá, Brejo das Almas, e ao poente, fica a lagoa do Tabual, no povoado de mesmo nome. Á margem, do Rio Caititu existem varias lagoas, pelos lados da Fazenda da Camarinhas, e nelas, todos os anos, eram praticadas pescarias.
Para as bandas do Córrego do Carrapato, fica a Lagoa dos Mouras ou Lagoa Nova.
Com a formação do Município de Janaúba, bem como de Capitão Enéas, desmembrados de Francisco Sá, várias lagoas passaram a pertencer a estes Municípios, por terem ficado nos territórios desmembrados. Uma delas é a Lagoa Grande, no Município de Janaúba.
Um grande abraço, amigos estudantes. Creio que aqui prestei minha modesta contribuição e espero ter atendido vossos anseios.
Enoque Alves Rodrigues, que atua na área de Engenharia, é Colunista, Historiador e divulgador voluntário de Francisco Sá, Brejo das Almas, Minas Gerais, Brasil.